Sustentabilidade no Acre: a modernização da criação de bezerros e seu potencial

Pecuaristas, a criação de bezerros é a base da pecuária de corte, e no estado do Acre, ela é a principal atividade econômica, respondendo por 60% do valor bruto da produção agropecuária local. Assista ao vídeo abaixo e confira os detalhes deste estudo.

No entanto, um diagnóstico recente da Embrapa Acre revela que essa importante atividade precisa de uma modernização urgente para garantir sua sustentabilidade e aumentar a produtividade.

Nesta quarta-feira (30), o programa Giro do Boi recebeu virtualmente, direto de Rio Branco (AC), o pesquisador Carlos Mauricio de Andrade, doutor em Zootecnia e coordenador do estudo.

Ele destacou que, apesar de 75,4% das propriedades possuírem pastagens de boa qualidade, 82% dos produtores são familiares e 71% praticam a criação de bezerros com baixa adoção de tecnologias.

Cenário da pecuária de cria no Acre: potencial e gargalos

Novilhas em área de curral. Foto: Vítor Macedo/Embrapa Acre
Novilhas em área de curral. Foto: Vítor Macedo/Embrapa Acre

O estudo da Embrapa Acre, que visitou 246 fazendas em 12 municípios acreanos, traça um retrato detalhado da pecuária de cria no estado, revelando tanto suas potencialidades quanto suas fragilidades.

Pontos positivos:

Consórcio de Brachiaria brizantha, cultivar Xaraés (também conhecida como MG5) e amendoim forrageiro. Foto: Divulgação/Embrapa AcreConsórcio de Brachiaria brizantha, cultivar Xaraés (também conhecida como MG5) e amendoim forrageiro. Foto: Divulgação/Embrapa Acre
Consórcio de Brachiaria brizantha, cultivar Xaraés (também conhecida como MG5) e amendoim forrageiro. Foto: Divulgação/Embrapa Acre
  • Pastagens de boa qualidade: 75,4% das propriedades possuem pastagens com boa qualidade. Isso se deve ao investimento em reforma e ao uso de gramíneas adaptadas à região, como a Brachiaria brizantha cultivar Xaraés (MG5), que é resistente ao encharcamento. O Acre, inclusive, possui o menor índice de degradação de pastagens na região Norte.
  • Diversificação: 73% dos produtores investem na diversificação, com o plantio de pelo menos três tipos de gramíneas em suas propriedades.

Gargalos e desafios:

  • Baixa adoção tecnológica: 71% dos criadores de bezerros utilizam poucas tecnologias, principalmente devido à falta de infraestrutura adequada nas fazendas.
  • Falta de assistência técnica e crédito: Os principais vetores para a adoção de tecnologias e a recuperação de pastagens degradadas são escassos, dificultando o acesso dos produtores.
  • Superlotação de pastos: A taxa de lotação média de 2,49 cabeças por hectare é 27,7% maior do que a média do estado. Isso indica que cerca de um terço das fazendas apresenta excesso de gado, o que causa superpastejo, comprometendo o desempenho dos animais, a persistência do pasto e, consequentemente, a renda do produtor.
  • Carência de informações: Produtores, especialmente os pequenos, têm pouco acesso a informações sobre as tecnologias disponíveis e as melhores práticas de manejo.
  • Mercado: O Acre produz o bezerro mais barato do Brasil, mas a produção em pequena escala dificulta a comercialização em leilões organizados, levando à venda para atravessadores e, muitas vezes, abaixo do preço de mercado.
  • Genética: Cerca de 80% dos criadores utilizam touros de “ponta de boiada” (com mérito genético desconhecido) como reprodutores. Essa prática compromete a qualidade genética do rebanho e limita o potencial produtivo.

Necessidade de modernização e políticas públicas

Foto: Divulgação/Embrapa AcreFoto: Divulgação/Embrapa Acre
Foto: Divulgação/Embrapa Acre

Carlos Mauricio de Andrade enfatiza que o primeiro passo para modernizar a pecuária de cria no Acre é conhecer a realidade da atividade e o perfil dos produtores e propriedades. A pesquisa da Embrapa identificou demandas claras por:

  • Transferência de tecnologias: Para disseminar o conhecimento já disponível e as inovações.
  • Investimentos em pesquisas estratégicas: Para o desenvolvimento de novas soluções adaptadas às condições locais.
  • Políticas públicas de apoio: Essenciais para os criadores e para o desenvolvimento sustentável do segmento.

A ausência de infraestrutura adequada nas propriedades, o grau de escolaridade dos produtores e a falta de informação são fatores que dificultam a modernização.

Tecnologias de baixo custo, como o consórcio de gramíneas com leguminosas (o amendoim forrageiro está presente em apenas 6% das fazendas), e o plantio direto de forrageiras a lanço (que dispensa o uso de tratores e reduz custos), são exemplos de soluções pouco difundidas, mas com grande potencial.

Estratégias para o futuro da pecuária acreana

A cultivar de amendoim forrageiro BRS Oquira. Foto: Divulgação/Embrapa AcreA cultivar de amendoim forrageiro BRS Oquira. Foto: Divulgação/Embrapa Acre
A cultivar de amendoim forrageiro BRS Oquira. Foto: Divulgação/Embrapa Acre

O estudo da Embrapa compila seus resultados em quatro publicações detalhadas e aponta estratégias para vencer as limitações e impulsionar a pecuária de cria no Acre:

  • Acesso à assistência técnica: Essencial para a correta adoção e implementação de tecnologias no campo.
  • Linhas de crédito rural: Ampliação do acesso a programas como o Pronaf e outros com juros subsidiados, facilitando investimentos.
  • Cooperativismo e associações: Apoio à criação de cooperativas para compras coletivas de insumos e comercialização conjunta de bezerros, superando a barreira da pequena escala de produção e fortalecendo o poder de negociação dos produtores.
  • Melhoramento genético: Incentivar programas como o Progenética (parceria da ABCZ com o Banco do Brasil) para financiamento de touros melhorados e acesso a genética de qualidade.
  • Modernização gradual: O processo deve ser adaptado à realidade socioeconômica dos pequenos produtores, priorizando “tecnologias de entrada” com baixo investimento e efeito direto na produtividade (por exemplo: calendário reprodutivo, vermifugação estratégica, manejo de pastagem).
  • Infraestrutura e logística: Destinar investimentos públicos para manutenção e melhoria de estradas e ramais, reduzindo custos logísticos e conectando produtores de áreas mais remotas aos mercados.
  • Educação: Priorizar o ensino médio técnico rural e capacitações continuadas em manejo, gestão e empreendedorismo para jovens e filhos de produtores, garantindo a sucessão familiar e a profissionalização.

A modernização da pecuária de cria no Acre deve ser um processo gradual e integrado, com intervenções em todos os elos da cadeia para garantir a sustentabilidade e a lucratividade do setor no estado.

Fonte: Canal Rural