Plantas de picão-preto (Bidens subalternans) resistentes foram identificadas em áreas no Paraná, assistidas pelas cooperativas Coamo e Lar. Uso constante e por longo tempo do mesmo princípio ativo costuma selecionar populações resistentes de plantas daninhas. Agora, são 12 as espécies de plantas daninhas resistentes ao glifosato no Brasil: o azevém, a buva (três espécies), o capim-amargoso, o caruru-palmeri, o caruru-gigante, o cloris, o capim pé-de-galinha, o leiteiro, o capim-arroz e o picão-preto. Custos de produção de soja com plantas resistentes ao glifosato podem subir até 222%, principalmente pelo aumento de gastos com herbicidas e pela perda de produtividade. Foi identificada a primeira ocorrência da planta daninha picão-preto (Bidens subalternans) resistente ao herbicida glifosato no Brasil, na safra 2022/2023. A dificuldade de controle foi relatada à Embrapa Soja por técnicos da Coamo Agroindustrial Cooperativa, que observaram a sobrevivência de uma população dessa espécie, no município de Juranda (PR). “Mesmo após aplicações sequenciais de glifosato, nas doses recomendadas nos rótulos e bulas, e executadas corretamente, o produto não controlou as plantas de picão-preto em lavouras de soja”, relata o pesquisador da Embrapa Fernando Adegas. Para avaliar o caso, um grupo composto por técnicos da Coamo e pesquisadores da Embrapa iniciou os estudos de comprovação da resistência em condições controladas. “Primeiramente, coletamos plantas sobreviventes na área para iniciar os estudos. Foram avaliadas, em análises adicionais, amostras de sementes e plantas de populações de picão-preto, também com suspeita de resistência ao glifosato, provenientes de outras propriedades, assistidas pela cooperativa Lar”, conta Adegas. “Ao mesmo tempo da realização dos estudos de constatação da resistência, conduzimos trabalhos de manejo dessa população [de plantas daninhas], tanto em casa de vegetação quanto no campo”, diz o pesquisador. O relato está disponível na publicação Novo caso de resistência de planta daninha ao glifosato no Brasil: picão-preto (Bidens subalternans). Em 2018, uma equipe de pesquisadores da Embrapa Soja e da Universidade Estadual de Maringá identificou no Paraguai, o primeiro, e até então o único, caso de resistência dessa espécie ao glifosato no mundo. Agora o Paraguai e o Brasil têm relatos de ocorrência de picão-preto resistente ao glifosato. A Embrapa e as cooperativas Coamo e Lar estão elaborando ações de monitoramento, manejo, mitigação e contenção da população de picão-preto resistente. “Também estamos planejando estudos para a determinação de qual é o mecanismo de resistência ao glifosato dessa população e se existe resistência múltipla a outros herbicidas”, afirma Adegas. Esses estudos estão sendo feitos em parceria com a Universidade Estadual de Maringá (UEM) e com a Pennsylvania State University (PSU), dos Estados Unidos. Picão-preto O picão-preto é uma planta daninha de ocorrência no Brasil, com predominância de duas principais espécies: Bidens pilosa e Bidens subalternans. “Por serem muito semelhantes e geralmente estarem presentes concomitantemente em áreas de cultivo, os produtores não fazem a diferenciação das espécies, denominando toda a população como picão-preto”, explica Adegas. Apesar da identificação da resistência de Bidens subalternans ao glifosato, populações de picão-preto já haviam sido identificadas como resistentes a outros herbicidas na década de 1990. Nesse período, os principais herbicidas utilizados para o controle dessa infestante eram os inibidores da enzima acetolactato sintase (ALS). “Devido à utilização continuada e praticamente exclusiva deste grupo de herbicidas foram selecionadas populações resistentes”, ressalta. Histórico de resistência no Brasil No Brasil, observa-se dois momentos relacionados à resistência de plantas daninhas. Os primeiros casos de resistência a herbicidas no País foram relatados em 1993, relativos às espécies Bidens pilosa (picão-preto) e Euphorbia heterophylla (leiteiro), resistentes a herbicidas inibidores da ALS. Atualmente, os produtores vivem uma segunda etapa das plantas daninhas resistentes ao herbicida glifosato. “Esse processo de resistência está relacionado ao uso constante do mesmo princípio ativo, na mesma área, e por longo período de tempo”, explica Adegas. O uso intensivo do glifosato acarretou grande pressão de seleção sobre as plantas daninhas, resultando na seleção de 12 espécies resistentes: azevém (Lolium perene spp multiflorum), três espécies de buva (Conyza bonariensis, C. canadensis, C sumatrensis) capim-amargoso (Digitaria insularis), caruru-palmeri (Amaranthus palmeri), caruru-gigante (Amaranthus hybridus), capim-branco (Chloris elata), capim-pé-de-galinha (Eleusine indica), leiteiro (Euphorbia heterophylla), o capim-arroz (Echinochloa crusgalli) e agora o picão-preto (Bidens subalternans). Estudo realizado pela Embrapa avaliou que os custos de produção em lavouras de soja com plantas daninhas resistentes ao glifosato podem subir, em média, de 42% a 222%, principalmente pelo aumento de gastos com herbicidas e pela perda de produtividade da soja. Segundo Adegas, os valores sobem, em média, entre 42% e 48%, para as infestações isoladas de buva e de azevém, respectivamente, e até 165%, se houver capim-amargoso resistente. Em casos de infestações mistas de buva e capim-amargoso, por exemplo, o aumento médio é de 222%. Processo de resistência Adegas define a resistência como a habilidade herdada de uma planta daninha em sobreviver e reproduzir-se após a exposição a uma dose de herbicida normalmente letal (dose de bula) para a população natural. “É uma ocorrência natural, devido às plantas daninhas evoluírem e se adaptarem às mudanças do ambiente e ao uso das tecnologias agrícolas”, explica. “Na prática, o surgimento da resistência ocorre pelo processo de seleção de indivíduos resistentes, já existentes na população presente nas áreas de produção, em função de aplicações repetidas e continuadas de um mesmo herbicida ou de herbicidas com o mesmo mecanismo de ação, durante determinado período de tempo”, aponta. Como prevenir a seleção de plantas resistentes Entre os métodos preventivos recomendados, Adegas destaca a aquisição de sementes livres de infestantes; a limpeza de máquinas e equipamentos, especialmente as colheitadeiras e a manutenção de beiras de estrada, carreadores e terraços livres de infestantes. No controle mecânico, a indicação é pelas capinas e roçadas. No caso de controle químico, a principal ação é a utilização de herbicidas de diferentes mecanismos de ação, em distintos sistemas de controle. Entre os métodos culturais, são recomendados a diminuição dos períodos de pousio, o investimento em produção de palhada para cobertura do solo e a utilização de cultivares adaptadas em espaçamento entre linhas, além da rotação de culturas. O estudo foi realizado seguindo o protocolo para relato de casos de resistência de plantas daninhas a herbicidas, proposto pelo Comitê de Resistência da Sociedade Brasileira da Ciência das Plantas Daninhas (SBCPD) e aprovado pelos Comitê de Ação de Resistência aos Herbicidas do Brasil (HRAC-BR) e Internacional (IRAC).
Foto: Fernando Adegas
O picão-preto (foto acima) é uma planta daninha de ocorrência no Brasil. É o primeiro registro da planta resistente ao herbicida glifosato no País
Foi identificada a primeira ocorrência da planta daninha picão-preto (Bidens subalternans) resistente ao herbicida glifosato no Brasil, na safra 2022/2023. A dificuldade de controle foi relatada à Embrapa Soja por técnicos da Coamo Agroindustrial Cooperativa, que observaram a sobrevivência de uma população dessa espécie, no município de Juranda (PR). “Mesmo após aplicações sequenciais de glifosato, nas doses recomendadas nos rótulos e bulas, e executadas corretamente, o produto não controlou as plantas de picão-preto em lavouras de soja”, relata o pesquisador da Embrapa Fernando Adegas.
Para avaliar o caso, um grupo composto por técnicos da Coamo e pesquisadores da Embrapa iniciou os estudos de comprovação da resistência em condições controladas. “Primeiramente, coletamos plantas sobreviventes na área para iniciar os estudos. Foram avaliadas, em análises adicionais, amostras de sementes e plantas de populações de picão-preto, também com suspeita de resistência ao glifosato, provenientes de outras propriedades, assistidas pela cooperativa Lar”, conta Adegas.
“Ao mesmo tempo da realização dos estudos de constatação da resistência, conduzimos trabalhos de manejo dessa população [de plantas daninhas], tanto em casa de vegetação quanto no campo”, diz o pesquisador. O relato está disponível na publicação Novo caso de resistência de planta daninha ao glifosato no Brasil: picão-preto (Bidens subalternans).
Em 2018, uma equipe de pesquisadores da Embrapa Soja e da Universidade Estadual de Maringá identificou no Paraguai, o primeiro, e até então o único, caso de resistência dessa espécie ao glifosato no mundo. Agora o Paraguai e o Brasil têm relatos de ocorrência de picão-preto resistente ao glifosato.
A Embrapa e as cooperativas Coamo e Lar estão elaborando ações de monitoramento, manejo, mitigação e contenção da população de picão-preto resistente. “Também estamos planejando estudos para a determinação de qual é o mecanismo de resistência ao glifosato dessa população e se existe resistência múltipla a outros herbicidas”, afirma Adegas. Esses estudos estão sendo feitos em parceria com a Universidade Estadual de Maringá (UEM) e com a Pennsylvania State University (PSU), dos Estados Unidos.
Picão-pretoO picão-preto é uma planta daninha de ocorrência no Brasil, com predominância de duas principais espécies: Bidens pilosa e Bidens subalternans. “Por serem muito semelhantes e geralmente estarem presentes concomitantemente em áreas de cultivo, os produtores não fazem a diferenciação das espécies, denominando toda a população como picão-preto”, explica Adegas. Apesar da identificação da resistência de Bidens subalternans ao glifosato, populações de picão-preto já haviam sido identificadas como resistentes a outros herbicidas na década de 1990. Nesse período, os principais herbicidas utilizados para o controle dessa infestante eram os inibidores da enzima acetolactato sintase (ALS). “Devido à utilização continuada e praticamente exclusiva deste grupo de herbicidas foram selecionadas populações resistentes”, ressalta. |
Histórico de resistência no Brasil
No Brasil, observa-se dois momentos relacionados à resistência de plantas daninhas. Os primeiros casos de resistência a herbicidas no País foram relatados em 1993, relativos às espécies Bidens pilosa (picão-preto) e Euphorbia heterophylla (leiteiro), resistentes a herbicidas inibidores da ALS.
Atualmente, os produtores vivem uma segunda etapa das plantas daninhas resistentes ao herbicida glifosato. “Esse processo de resistência está relacionado ao uso constante do mesmo princípio ativo, na mesma área, e por longo período de tempo”, explica Adegas. O uso intensivo do glifosato acarretou grande pressão de seleção sobre as plantas daninhas, resultando na seleção de 12 espécies resistentes: azevém (Lolium perene spp multiflorum), três espécies de buva (Conyza bonariensis, C. canadensis, C sumatrensis) capim-amargoso (Digitaria insularis), caruru-palmeri (Amaranthus palmeri), caruru-gigante (Amaranthus hybridus), capim-branco (Chloris elata), capim-pé-de-galinha (Eleusine indica), leiteiro (Euphorbia heterophylla), o capim-arroz (Echinochloa crusgalli) e agora o picão-preto (Bidens subalternans).
Estudo realizado pela Embrapa avaliou que os custos de produção em lavouras de soja com plantas daninhas resistentes ao glifosato podem subir, em média, de 42% a 222%, principalmente pelo aumento de gastos com herbicidas e pela perda de produtividade da soja. Segundo Adegas, os valores sobem, em média, entre 42% e 48%, para as infestações isoladas de buva e de azevém, respectivamente, e até 165%, se houver capim-amargoso resistente. Em casos de infestações mistas de buva e capim-amargoso, por exemplo, o aumento médio é de 222%.
Processo de resistência
Adegas define a resistência como a habilidade herdada de uma planta daninha em sobreviver e reproduzir-se após a exposição a uma dose de herbicida normalmente letal (dose de bula) para a população natural. “É uma ocorrência natural, devido às plantas daninhas evoluírem e se adaptarem às mudanças do ambiente e ao uso das tecnologias agrícolas”, explica. “Na prática, o surgimento da resistência ocorre pelo processo de seleção de indivíduos resistentes, já existentes na população presente nas áreas de produção, em função de aplicações repetidas e continuadas de um mesmo herbicida ou de herbicidas com o mesmo mecanismo de ação, durante determinado período de tempo”, aponta.
Como prevenir a seleção de plantas resistentesEntre os métodos preventivos recomendados, Adegas destaca a aquisição de sementes livres de infestantes; a limpeza de máquinas e equipamentos, especialmente as colheitadeiras e a manutenção de beiras de estrada, carreadores e terraços livres de infestantes. No controle mecânico, a indicação é pelas capinas e roçadas. No caso de controle químico, a principal ação é a utilização de herbicidas de diferentes mecanismos de ação, em distintos sistemas de controle. Entre os métodos culturais, são recomendados a diminuição dos períodos de pousio, o investimento em produção de palhada para cobertura do solo e a utilização de cultivares adaptadas em espaçamento entre linhas, além da rotação de culturas. |
O estudo foi realizado seguindo o protocolo para relato de casos de resistência de plantas daninhas a herbicidas, proposto pelo Comitê de Resistência da Sociedade Brasileira da Ciência das Plantas Daninhas (SBCPD) e aprovado pelos Comitê de Ação de Resistência aos Herbicidas do Brasil (HRAC-BR) e Internacional (IRAC).
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